A palavra epilepsia
Utilizada
pela primeira vez por Avicena (980-1037), no século 11, é originada do
verbo grego epilambanein que significa ser tomado, atacado ou dominado,
ou seja, trata-se de um verbo que sugere que uma força externa provoca a
crise. Para os antigos, uma divindade ou um espírito diabólico.
Epilepsia, é definida como uma moléstia cerebral, que se manifesta por
acessos, em há abolição completa dos sentidos e da razão, acompanhados
de movimentos convulsivos.
Pré-história
Através
dos monumentos, das inscrições arcaicas e das ossadas humanas foi-nos
possível decifrar o pensamento do homem em suas primeiras e penosas
realizações. Provavelmente desde o Período Neolítico existiam cirurgiões
hábeis e nas ossadas estudadas por Lucas-Championnière conservadas no
Museu do Homem, de Paris, foram encontrados crânios trepanados e
cicatrizados, prova de operações realizadas no ser vivo. Há quem afirme
que tais trepanações tivessem por finalidade libertar os maus espíritos
ou demônios presos na caixa craniana de alguns doentes, entre os quais
pessoas com epilepsia, mas esta conclusão é apenas uma especulação;
porém, sem dúvida, este procedimento foi utilizado no tratamento de
traumatismos cranianos, fato já descrito em detalhes no trabalho
hipocrático Sobre os Ferimentos na Cabeça. A trepanação (do grego
trupanon, perfurar), foi praticada na Idade da Pedra, no Egito Antigo,
no período pré-histórico e clássico da Grécia e de Roma, no Médio e
Extremo Oriente, entre as tribos célticas, na China, Índia, entre os
maias, astecas, incas e índios brasileiros, nos mares do sul e na África
equatorial, onde a trepanação ainda é realizada. Na Europa, da Idade
Média ao século 18, a trepanação era tão comum como a sangria e
procedimentos múltiplos não eram infreqüentes.
Este
foi um método de tratamento utilizado naepilepsia traumática e a
primeira série de pacientes a ele submetido foi relatada por Benjamin W.
Dudley (1783-1870), que popularizou esta modalidade de cirurgia nos
Estados Unidos na era pré-Listeriana. Baseado na suposição que epilepsia
era freqüentemente causada por compressão cerebral por fraturas de
crânio, este cirurgião de Kentucky trepanou cinco pacientes entre 1818 e
1827, três dos quais permaneceram sem crises e dois, melhoraram. Na
Antigüidade, os sinais de cicatrização, presentes em alguns crânios,
indicam que nem todas as pessoas submetidas a trepanação morriam e que
3000 anos antes de nossa época já se praticava este tipo de intervenção.
Hieronymus Bosch (c.1450-1515). “A Cura da
Loucura” ou “A Operação da Pedra”. Museu do Prado, Madri. Este quadro
mostra uma pessoa realizando uma incisão cirúrgica no escalpo. Os
removedores de pedra eram pessoas itinerantes que alegavam poder curar
todas as formas de doenças mentais. A inscrição diz: Mestre, remova as
pedras da loucura, meu nome é ‘bassê castrado’. Estes dizeres refletem
uma crença à época do Renascimento de que a loucura, a estupidez e a
tolice eram devidas à presença de pedras na cabeça. ‘Bassê castrado’ era
um epíteto para ingênuo. Uma tulipa, e não uma pedra, está sendo
removida do crânio; no século 16, na Holanda, a tulipa era símbolo da
estupidez. Segundo outra interpretação, não é uma tulipa que está sendo
removida, mas uma flor de lótus, símbolo antigo do despertar espiritual.
Babilônia
Os
babilônios, que sucederam os sumérios na região da Mesopotâmia (2500 a
600 a.C.) consideravam as doenças como formas de interferências de
deuses e demônios no organismo humano, sendo assim passíveis de cura
através de orações, súplicas e rituais de exorcismo. Apesar desta forte
interpretação sobrenatural dos fenômenos que afligiam o homem este povo
usava medicamentos sob as formas de macerados, decocções, cataplasmas e
linimentos. Diagnosticar as doenças e estabelecer prognóstico por
intermédio de adivinhações e tratá-las por meio de exorcismo eram, no
entanto, os fundamentos dos atos médicos, sempre praticados por
sacerdotes.
O “Tratado do Diagnóstico
Médico e do Prognóstico” que se encontra no Museu Britânico, consta de
40 pedras babilônicas dedicadas à Medicina (Sakkiku) datadas de pelo
menos 2000 a.C. Na de número BM47733 há registro de vários tipos de
crises atualmente reconhecidos como ausências súbitas, desvio da cabeça e
dos olhos, automatismos simples e complexos, ocorrência de padrões
cíclicos além de crises em série (status epilepticus), aura epigástrica e
alucinações auditivas.
No
tratado babilônico é enfatizada a natureza sobrenatural da epilepsia
sendo cada tipo de crise associado a um espírito ou deus específico –
usualmente diabólico. Espíritos diabólicos circulariam durante a noite
possuindo ou tocando as pessoas provocando crises com características
distintas das diurnas. O tratamento se baseava principalmente em
princípios espirituais.
Nesta época, como
escravos eram objetos de propriedade, os códigos protegiam seus
proprietários contra perdas. O artigo 278 do código de Hamurabi (2080
a.C.), das leis babilônicas, que contém a mais antiga regulamentação da
prática da Medicina, estabelecia o direito de anulação da venda de um
escravo, homem ou mulher acometida por bennu no período de um mês. No
contrato de venda assírio do século 7 a.C. o termo foi estendido por cem
dias, sendo incluída como causa para invalidar a venda uma segunda
doença, denominada sibtu. Há muita especulação sobre a natureza destas
doenças e a de Karl Sudhoff é a mais convincente. Baseado em cuidadosa
interpretação filosófica e avaliação das passagens envolvidas, ele
chegou à conclusão que bennu era uma doença convulsiva, possivelmente
epilepsia, enquanto sibtu era uma doença contagiosa, provavelmente
lepra. Nos contratos gregos no Egito Helenístico estas doenças eram
mencionadas como causas de devolução de um escravo. O código de Hamurabi
estabelecia ainda regras relativas ao matrimônio entre pessoas com
epilepsia.
Egito
Os
egípcios identificaram a epilepsia através de seus hieróglifos com
figuras que simbolizavam a entrada de uma pessoa morta ou de um demônio
no interior da vítima e a consideravam uma enfermidade sobrenatural e
misteriosa (Meinardi, 1989). O papiro cirúrgico de Edwin Smith (1770
a.C.), considerado uma cópia de um manuscrito mais antigo, é apontado
como o mais antigo tratado de cirurgia, e sua autoria é atribuída a
Imhotep, nome que significa “aquele que vem em paz”, que foi,
provavelmente, um ministro e médico do rei Loar, que reinou cerca de
3000 anos a.C.; nele foi citado que as convulsões seriam o resultado da
estimulação do cérebro por ferimentos. Os egípcios reconheciam o
distúrbio que os gregos mais tarde chamaram de histeria (hysteron,
útero) e acreditavam que seus sintomas eram causados por posicionamento
anômalo do útero preconizando fumigamento da vagina no sentido de
reposicioná-lo. Este tratamento foi adotado pelos gregos e romanos sendo
que Hipócrates e Galeno o reconheciam sem reserva.
Epilepsia como a Doença dos Deuses
A
Epilepsia passou a ser denominada Doença dos Deuses provavelmente em
referência a Hércules que teria apresentado este distúrbio.
Hércules
(Héracles) era filho de Júpiter (Zeus) e Alcmena, uma de suas amantes
mortais. Juno (Hera), a esposa de Júpiter e rainha dos deuses, declarou
guerra a Hércules desde o seu nascimento. Mandou duas serpentes para
matá-lo em seu berço, mas a criança estrangulou-as com as próprias mãos.
Pelas artes de Juno, contudo, ele ficou sujeito ao rei Euristeu e
obrigado a executar todas as suas ordens.
As
imposições de Euristeu constituíram “Os Doze Trabalhos de Hércules”.
Hércules era representado como um homem de estatura moderada
extraordinariamente forte, voraz, apreciador de bebidas alcoólicas,
muito amoroso, geralmente gentil, porém sujeito a crises ocasionais de
cólera brutal.
Em
um de seus acessos de fúria matou uma de suas esposas, a princesa
Mégara e os filhos do casal, indo em seguida ao solo, onde dormiu; ao
despertar, sob o impacto de uma pedra lançada do céu pela deusa Minerva
(Palas), estava curado, porém incapaz de se recordar de todo o episódio.
Sonos prolongados e despertares com desorientação, algumas vezes apenas
obtidos através da aspiração dos filtros da deusa Palas, permeavam o
cumprimento das ordens de Euristeu.
Alguns
dos que interpretam a doença de Hérculescomo epilepsia acreditam que os
grandes trabalhos a ele impostos o tornaram vulnerável à doença. Outros
que apenas um nome como o do poderoso herói pudesse ressoar em
consonância com a grandeza da doença. Disse Anatole France: “Havia em
Hércules uma doçura singular. Depois de em seus acessos de cólera
golpear culpados e inocentes, fortes e fracos, caía em si e chorava. E
talvez até tivesse dó dos monstros que andou destruindo por amor aos
homens: a pobre Hidra de Lerna, o pobre Minotauro, o famoso leão do qual
tirou a pele para transformá-la em peliça. Mais de uma vez, ao fim dum
daqueles feitos, olhou horrorizado para a clava suja de sangue... Era
robustíssimo de corpo e frágil de coração”. Hércules foi curado por
Medéia em Tebas e a afirmação mais importante, após a de Hipócrates, de
que teria apresentado epilepsia foi feita em data incerta por um
compilador dos “Problemas”, obra atribuída a Aristóteles. Nela, o autor
enfatizou o comportamento melancólico do herói, em quem a bile negra
teria causado alterações mentais.
Embora
não tenha sido afirmado que Hércules apresentasse epilepsia, o autor
alista este distúrbio entre as doenças causadas pela bile negra,
referindo que os antigos autores a teriam denominado “doença sagrada” em
referência a Hércules. Na Renascença, a observação de que todos os
homens excepcionais haviam sido melancólicos fez com que florescesse a
idéia de que grandes homens seriam particularmente propensos à
epilepsia.
Grécia. A doença sagrada
A
civilização grega teve seu início no final do século 13 a.C. e
extinguiu-se ao final do século 5 d.C. compreendendo quatro períodos
distintos: o período arcaico (séculos 13 a 5 a.C.), no qual as doenças
eram atribuídas a fatos sobrenaturais e aos deuses, constituindo a
medicina dos santuários; o período clássico (séculos 5 a 4 a.C.) quando a
partir da medicina dos filósofos, surgiram as escolas médicas como as
de Cnido e Cós que formavam médicos especialistas, inteiramente
devotados à profissão e completamente independentes e dignos do mais
alto respeito; dela advieram os conceitos éticos da Medicina e a Ética
Médica de nossos dias; o período helenístico-macedônico (séculos 4 a 3
a.C.) quando a Grécia foi conquistada pelo Império Macedônico e a
medicina transferiu-se para a Escola de Alexandria, onde estudou Galeno;
nesta época ocorreu o declínio e extinção da civilização grega clássica
e o período helenístico-romano (séculos 1 a.C. a 5 d.C.) com
transferência dos conhecimentos gregos para a cultura latina. No período
arcaico, do qual herdamos os textos de Homero da Ilíada e Odisséia, os
gregos, influenciados pelos babilônios, remetiam a seus deuses a
regência integral do comportamento e da natureza do homem que seriam os
responsáveis por seus atos, saúde e por doenças que lhes eram
infringidas como punições.
Na Ilíada, poema
épico que narra o cerco a Tróia, Homero descreveu a figura do Príncipe
de Trica, na Tessália, médico acatado e famoso, que aprendeu medicina
com o centauro Quironte. Este médico que se tornou conhecido como
Asclépio, ou Esculápio dos romanos, sofreu, a princípio, um processo de
glorificação e depois, de divinização tornando-se herói sobre-humano e
Deus da Medicina.
Epilepsia. “Sobre a doença sagrada”
Há
várias hipóteses sobre a origem da denominação doença sagrada. Uma
delas se baseia na crença de que a doença representaria a possessão por
uma divindade ou por um demônio. Outra na de que as pessoas afligidas
pelo mal haviam pecado contra Selene, a deusa da lua ou ainda a de que
esta constituiria uma doença sagrada, pois sua cura não poderia se
processar por meios humanos mas apenas pela intervenção divina.
Finalmente, outra razão pela qual a doença pode ter sido chamada sagrada
vem da implicação de que em tempos antigos os deuses e os demônios eram
igualmente temidos.
No “Corpus
Hipocraticus” a epilepsia foi ainda chamada de ‘grande doença’, termo
referido como ‘morbus maior’ em latim; na França, na Idade Medieval,
tornou-se ‘le grand mal’. No período clássico, apesar do desenvolvimento
extraordinário da Medicina, a concepção babilônica ainda foi precursora
do título do terceiro livro Hipocrático (400 a.C.) “Sobre a Doença
Sagrada” que faz parte do “Corpus Hipocraticus”, obra composta por cerca
de sessenta tratados anônimos de médicos-filósofos das Escolas Médicas
de Cós (associada ao próprio Hipócrates) e de Cnido, escritos entre os
anos 460 e 330 a.C. O manuscrito, escrito por um médico, mas dirigido a
legisladores, contém o conceito revolucionário de que esta não se
tratava de uma doença sagrada porém de um distúrbio cerebral. “Ela não é
mais sagrada do que qualquer outra doença e apresenta como causa,
fatores naturais; a suposição de uma origem divina é decorrente da
inexperiência humana.
Cada uma das doenças
tem uma causa própria, decorrente de fatores externos”. Seu texto renega
as crendices supersticiosas e mágicas que cercavam a doença e seu autor
não acredita que o “homem possa ser invadido por um deus, significado
de extrema pureza”, apregoando que aqueles que asseguram que deuses
poderiam causar tal sofrimento são hereges, que a doença é hereditária e
que sua causa está localizada no cérebro. Como tal não deveria ser
tratada por mágica, mas por dieta e drogas. Hipócrates enfatizou ainda a
importância da vida sedentária, sugerindo o controle das crises por
mudanças de clima, país e hábitos de vida e o início precoce da doença,
excepcional após os 20 anos de idade. Finalmente, reconheceu a
variabilidade das manifestações clínicas durante as crises, como no
texto: “E eu sei que várias pessoas gemem e gritam durante o sono,
algumas parecem em choque enquanto outras levantam e deambulam e
apresentam-se comprometidas até o momento em que despertam saudáveis e
sensíveis como antes, apenas pálidas e fracas e isto não ocorre uma vez,
mas freqüentemente”.
Tais paroxismos não
necessariamente eram considerados de natureza epiléptica, pois o autor
do texto nega que tais eventos fossem considerados sagrados. Hipócrates
recomendou ainda tratamentos físicos chegando a fazer implicações
prognósticas ao afirmar que se a doença se tornasse crônica, seria
incurável.
Roma
No
século 1 d.C. a República Romana transformou-se no Império Romano,
compreendendo todos os territórios pertencentes ao Império Macedônico
incluindo a Macedônia, a Grécia, o Egito, a Palestina e a Síria,
transformados em províncias. Os intelectuais e artesãos mais hábeis eram
transferidos para Roma como escravos. Os intelectuais gregos passaram a
exercer profundas influências sobre a cultura latina e a religião
romana. Os homens cultos, os filósofos, os políticos e os médicos do
Império Romano cultivaram a retórica, a dialética e as doutrinas
filosóficas gregas e a medicina Hipocrática.
Os
conhecimentos médicos que nos chegaram da época da criação do Império
Romano procedem dos grandes enciclopedistas como Celso e Plínio. Aulo
Cornélio Celso, chamado de “Cícero da Medicina” por seu fino estilo
literário, nos deixou a primeira história médica organizada, De res
medica, uma obra pouco conhecida em sua época e esquecida na Idade
Média, que foi descoberta em 426 e, em 1478, tornou-se o primeiro texto
antigo de medicina a ser impresso. Caio Plínio Segundo (Plínio, o
Velho), viveu de 23 a 79 d.C. e é considerado o maior naturalista
romano. Plínio escreveu uma obra monumental, Historia Naturalis, que
contém informações de tudo o que pôde pesquisar no passado e ao seu
tempo. Em sua obra de 37 volumes, à qual dedicou todas as suas horas
durante anos, descreveu remédios obtidos de fontes vegetais, minerais e
animais e fez várias referências à saúde pública. Plínio morreu quando
satisfazia sua curiosidade sobre vulcões, na erupção do Vesúvio que
sepultou as cidades de Pompéia e Herculano.
Na
Roma antiga a epilepsia era considerada a antítese da morbus sacer – a
morbus demoniacus e a pessoa com epilepsia era considerada impura;
acreditava-se ainda que fosse transmitida por contágio. A crença em um
espírito demoníaco levou à prática de se defender do mal cuspindo no
paciente, daí a denominação morbus insputatus. Morbus comitialis (mal
comicial) foi um termo cunhado pelo fato de que a ocorrência de uma
convulsão na assembléia ou comitia romana, significava a necessidade de
suspensão imediata da mesma, contrária aos desejos dos deuses.
Por
milhares de anos a humanidade foi fascinada pelos humores corporais,
aprendidos de Hipócrates. Os quatro mais importantes incluíam o sangue, a
bile negra e amarela e a fleuma. Como causa de epilepsia, a fleuma das
artérias era levada à cabeça, resultando em interrupção do suprimento
aéreo. Acreditava-se que o sangue circulasse apenas nas veias que o
transportavam ao coração enquanto as artérias veiculavam ar. A presença
de saliva espumante na boca de uma pessoa no momento de uma crise era
uma prova do acúmulo de fleuma. Entre os predecessores de Galeno que
enfatizaram a epilepsia, a que denominava mal de Hércules, destacou-se
Areteu de Capadócia, que viveu na metade do primeiro século desta era.
Areteu acreditava na possessão demoníaca embora já antecipasse a
necessidade da recorrência crônica das crises para o diagnóstico de
epilepsia e separasse os sinais premonitórios das auras que antecedem
imediatamente a crise: entre os primeiros, estupor, vertigem, tensão nos
membros, ingurgitamento e edema das veias do pescoço, aversão aos
alimentos, vômitos e flatulência enquanto, na proximidade na crise, o
aparecimento de luzes vermelhas, negras ou de ambos os tipos sob a forma
de arcos, semelhantes aos do arco-íris ou alucinações auditivas, maus
odores, irritabilidade e nervosismo imotivados. Descreveu ainda os
fenômenos ictais da crise tônico-clônica separando-os em três fases, a
fase inicial, de manifestação, caracterizada por insensibilidade e
convulsão tônica e depois clônica, sufocação e, no final da mesma,
ereção genital; a de abatimento, com emissão de urina, fezes, sêmen e
fluxo de saliva, representando a emissão da fleuma, sinalizando o
término da sufocação. O aparecimento destes sinais indicava a extinção
da possessão e, finalmente, a fase de trégua, durante a qual
persistiriam ainda vários sinais de desconforto físico e psíquico.
Cláudio
Galeno, de Pérgamo, médico grego que após quatro anos de experiência
como médico de gladiadores transferiu-se para Roma onde viveu ao redor
de 131 a 201 da nossa era, exerceu uma autoridade que não foi discutida
por 1500 anos e entre seus 400 trabalhos, escreveu Ars Magna,
considerado o texto médico básico na Idade Média.
Se
Hipócrates é considerado um dos fundadores da medicina grega, foi
através do galenismo que este conhecimento foi transmitido à Renascença.
A grande aceitação de Galeno deveu-se à qualidade de sua obra e ao fato
de que, embora não cristão, acreditava em um só Deus apregoando que o
corpo era instrumento da alma. A essência do método de Galeno era
anatômica e experimental, tendo efetuado estudos fisiológicos em animais
e lesões cerebrais e raquidianas para traçar vias nervosas. Galeno
acreditava que a fleuma produzida no braço ou perna se propagava ao
resto do corpo e que esta seria a razão pela qual as crises que se
iniciavam em um membro acometiam sucessivamente outras de suas partes.
Em decorrência deste fato preconizava como tratamento aplicação de um
torniquete e, até mesmo, amputação, como se fazia para interromper a
disseminação de substâncias lesivas em acidentes ofídicos. Se as crises
não apresentavam início localizado, era usado um método mais drástico
para remover a fleuma que havia alcançado a cabeça, o da trepanação, que
permitia a drenagem através de um orifício triangular feito na parte
posterior do crânio, pois se acreditava que a fleuma assumia um trajeto
descendente da convexidade para a base da cavidade craniana.
Causas e tratamento da epilepsia A doença da lua. A influência lunar nos transtornos afetivos e na epilepsia.
A
visão de Hipócrates sobre epilepsia como um distúrbio cerebral só
retornaria nos séculos 18 e 19. Os quase 2000 anos que os separam foram
dominados pelo conceito advindo da Antigüidade da influência de forças
sobrenaturais. Ele foi reforçado, por exemplo, na descrição de Cristo
afastando o demônio de um menino com epilepsia, chamado de “lunático”
(Marcos, 9 : 14-29, passagem também citada por Mateus e Lucas).
Na
Antigüidade, como ocorreu com várias outras doenças periódicas,
especialmente as que afetam a mente, acreditava-se que a epilepsia fosse
controlada por corpos celestiais, particularmente pela lua, que não
seria um mero satélite da Terra, mas também uma divindade.
No
início de nossa era, com o cristianismo, a epilepsia deixou de ser
atribuída à vingança de Selene, deusa da lua, surgindo explicações
naturais de que o aquecimento da atmosfera terrestre pela lua derreteria
o cérebro, promovendo crises. Galeno sugeriu uma explicação astrofísica
segundo a qual o efeito da lua na periodicidade das crises dependia da
maior ou menor influência que o satélite recebia do sol sendo que seus
efeitos atingiriam maior magnitude na lua cheia. Da mesma forma objetos
influenciados pela lua poderiam ser usados para expor ou impedir a
ocorrência de uma crise. O toque na pessoa com doença sagrada com
azeviche ou com pedra caristiana, uma substância semelhante a asbestos
usada como pavio de velas cuja chama aumenta ou esvaece conforme as
fases da lua, promoveria o desencadeamento imediato de uma crise. No
início do século 19, com a aplicação dos primeiros métodos estatísticos,
surgiram dados científicos sobre esta relação como os de Leuret, que
acompanhou as crises diárias de 70 pacientes durante um ano e não
encontrou correlação das mesmas com as fases da lua e os de Moreau que
também chegou a resultados negativos analisando 42637 ataques de 108
homens em cinco anos.
No
século 16, Ferdinandus descreveu o caso de um indivíduo que apresentou
crises após passar uma noite de verão sob uma oliveira, numa atmosfera
tépida, úmida, inundada pela luz quente da lua. Desde a Antigüidade a
idéia de que o cérebro das pessoas se altera em simpatia com a lua, fez
ainda com que, já no penúltimo ano deste milênio, Raison et al.(1999)
buscassem uma nova forma de interpretação deste fenômeno baseados em
conceitos médicos atuais. Segundo estes autores, a luz da lua poderia
influenciar a freqüência de crises, pois antes do advento dos sistemas
de iluminação modernos a iluminação noturna pela lua, especialmente na
fase de lua cheia, afetaria o ciclo nictemeral, causando privação de
sono, que seria suficiente para induzir surtos de mania ou hipomania em
indivíduos com transtornos afetivos e crises em pessoas com epilepsia.
A vida sexual
Celso
considerava a epilepsia mais comum no homem do que na mulher e
influenciada pela vida sexual. O ataque epiléptico era comparado ao ato
sexual e tanto Hipócrates como Demócrito afirmavam que o “coito é um
ataque epiléptico leve”. A puberdade era considerada decisiva no curso
da epilepsia sendo afirmado nos textos Hipocráticos que muitas pessoas
podiam parar de apresentar crises neste período; caso isto não
ocorresse, a doença seria considerada incurável. Conseqüentemente,
alguns atribuíam a cura nesta faixa etária ao primeiro ato sexual e
aconselhavam até mesmo a violência do coito, inadequada à natureza da
criança, a fim de apressar o efeito benéfico.
A
maioria pensava que o coito era prejudicial à pessoa com epilepsia e
aconselhava abstinência sexual, sendo preconizada até mesmo a castração.
Distúrbios na esfera sexual eram tidos como fatores etiológicos. Galeno
considerava a influência do ato sexual em época inadequada e
Hipócrates, a interrupção da menstruação. Na Antigüidade a influência do
ato sexual sobre epilepsia foi muito discutida e na Idade Média e
Renascença prevalecia a idéia de que os excessos sexuais eram
prejudiciais às pessoas com epilepsia, embora a abstenção sexual
completa também podia desencadear eventos epilépticos. Na segunda metade
do século 18 este ponto de vista foi fortemente enfatizado. Tissot
considerava que “excessos sexuais causavam crises epilépticas até mesmo
nas pessoas mais fortes, que nunca as havia apresentado”. Por outro
lado, ele admitia que o excesso de contenção sexual ocasionava o mesmo
efeito.
Do ponto de vista contemporâneo
estas opiniões são compreensíveis, pois a interpretação fisiopatogênica
da doença envolvia paixões excessivas e humores desintegrantes. No
entanto, ao mesmo tempo, a atenção médica passou a se concentrar não
mais nos excessos sexuais mas sobre a masturbação. Nos séculos iniciais
desta era, a religião condenava este hábito que por este motivo, naquele
momento, foi considerado culpado da origem de várias doenças. No seu
livro “Sobre a masturbação”, que se tornou um clássico no assunto,
Tissot resumiu as observações dos médicos antigos, de seus
contemporâneos e dele próprio, descrevendo as conseqüências prejudiciais
da masturbação – entre as quais epilepsia constitui uma das principais.
Ele assinalou que a masturbação é muito mais perigosa do que o mero ato
sexual inconseqüente. “A grande quantidade de sêmen perdida no ato
sexual natural produz efeitos terríveis; mas seus efeitos são ainda mais
danosos quando a mesma quantidade é dissipada de forma não natural.
Os
acidentes que ocorrem por tal desperdício de forma natural são
horríveis e aqueles provocados pela masturbação são ainda piores”.
Tissot discorreu sobre as várias razões pelas quais isto ocorreria, as
quais, contudo, não parecem convincentes: “Os masturbadores se sujeitam a
desejar sem serem desejados. É a imaginação, o hábito e não a natureza
que os importuna”. Por mais de cento e cinqüenta anos a masturbação
figurou como uma das principais causas de epilepsia na literatura
médica. Há poucos autores que não a enfatizaram ou que não a
mencionaram. Schroeder van der Kolk (1797-1862), que atribuía a
epilepsia à hiperexcitabilidade do bulbo, assinalou entre os irritantes
“... acima de tudo, a prática de onanismo, que age sobre o bulbo e deve
ser considerado uma causa importante de epilepsia”.
A
superstição alcançou o máximo no último terço do século 19, quando foi
considerado o recurso da clitoridectomia e da castração em casos
extremos. A castração foi ainda preconizada em casos de suposta
epilepsia simpática que constituía um princípio fisiopatogênico vigente
na época, nos quais as crises teriam origem nos testículos. Mas a
castração visava principalmente interromper a masturbação e assim curar a
epilepsia. Em 1881 Gowers assinalou que a castração não apresentava
benefícios no tratamento da epilepsia, embora o eminente professor
londrino acreditava que a circuncisão poderia ter sucesso nos casos
associados à masturbação. A masturbação foi considerada causa importante
não só de epilepsia como também da doença mental. Esta relação foi
discutida detalhadamente por Hare em seu artigo “Insanidade
masturbatória”. No século 19, todas as estatísticas consideravam a
masturbação, os distúrbios menstruais e sexuais entre as causas mais
freqüentes de epilepsia.
Crises
epileptiformes na mulher grávida (eclâmpsia) também foram observadas e
atribuídas ao útero. “Tem-se verificado na mulher grávida que a
epilepsia se origina no útero e cessa após o parto”. O útero e os
ovários iriam ainda ser considerados como origem da histero-epilepsia no
final do século, principalmente nos trabalhos desenvolvidos na
Salpêtrière liderados por Charcot .
Epilepsia como doença infecciosa
Durante
uma época se acreditou que a epilepsia fosse uma doença infecciosa,
causada por vários venenos ou toxinas que invadiam o corpo a partir do
exterior. As convulsões representavam a tentativa do corpo de se livrar
destas substâncias lesivas exatamente da mesma forma que os soluços
representavam uma tentativa do estômago de se esvaziar de alimentos
nocivos. A suspeita de que a epilepsia pudesse se tratar de uma doença
infecciosa contribuiu para o aumento extraordinário em sua
discriminação.
Em Roma, como medida
preventiva, o costume de cuspir na pessoa com epilepsia representava uma
tentativa para manter os espíritos diabólicos fora de si próprio. Na
Europa medieval também se acreditava que epilepsia era uma doença
infecciosa, o que fazia com que as pessoas com crises fossem segregadas
na Igreja não podendo participar da Eucaristia para que não
contaminassem e assim não profanassem o prato e o copo da comunhão.
Médicos
suspeitavam que o contágio se processasse pela respiração. Em Basiléia,
o conselho da cidade ordenou que as pessoas com epilepsia não poderiam
vender alimentos ou bebidas e que deveriam ser expulsos da cidade.
Siegmund Albich, um professor do século 15 escreveu “Não fale nem se
banhe com eles, pois sua respiração pode infectar as pessoas”. Assim,
como algumas vezes ainda hoje, a doença era vista como uma maldição,
algo que só se poderia desejar ao pior inimigo. Martinho Lutero
imprecava à Igreja Católica ‘praga, sífilis, epilepsia, escorbuto, lepra
e carbúnculo’ e denominava a epilepsia morbus daemoniacus.
A
origem infecciosa da doença prevaleceu ainda no início deste século,
quando se preconizou colectomia ou vacinação para a erradicação do
Bacillus epilepticus em algumas formas de epilepsia.
Idade Medieval. Morbus caducus. A doença das quedas
Na
Europa, durante a Idade Média (que compreendeu o longo período desde a
conquista do Império Romano Ocidental pelos povos germânicos em 476 d.C.
até a conquista de Constantinopla pelos turcos em 1453 d.C.), a doença
sagrada passou a ser conhecida comumente como doença das quedas.
Durante
este milênio, povos de várias origens e idiomas lutaram para sobreviver
numa Europa torturada pelas rivalidades e pela peste, saindo do
barbarismo para uma sociedade de homens, baseada em ordem, caridade e no
amor a Deus. As sucessivas pestes como a do Vesúvio em 79, a de Orose
em 125, a peste Antonina em 164 que durou 16 anos, a de Cipião em 251 e a
Justiniana no ano 312, coincidiram com a ascensão do cristianismo e um
descrédito para a arte de curar, incapaz de sustar as repetidas ondas de
epidemias e um recrudescimento da fé nos meios sobrenaturais. Nesta
época, poucos foram os nomes que se destacaram na Medicina. Entre eles,
Avicena (980-1037), médico árabe de origem persa, “...mistura de
libertino e asceta, dedicado ao vinho (para suportar as prolongadas
vigílias sobre os livros) e às libações de cocaína assim como às
abundâncias dos haréns” a quem devemos o uso da palavra “epilepsia” e o
termo “mater puerorum”, sugerindo a freqüência das convulsões na
infância.
Com
o crescimento da influência da Igreja Católica as pessoas passaram a
esperar o auxílio de santos e relíquias sendo a terapia medieval baseada
na expulsão de humores corruptos por purgações, eméticos, sangrias e
enemas.
Entre estas medidas terapêuticas, a
sangria talvez tenha sido a mais utilizada e seu princípio se baseava
na crença de que a doença era causada por excesso de fluido (plethora). A
sangria desviava o material causador da doença e o forçava a se
deslocar de um órgão para outro. Quando o sangue era tirado do lado do
corpo oposto ao da doença, era revulsivo; mas se tirado do mesmo lado,
era derivativo, aliviando a dor do paciente. Havia instruções detalhadas
sobre os melhores dias e horas para a realização de sangria bem como as
melhores veias para se trabalhar e qual a quantidade de sangue a ser
tirado. Tirar sangue era prática comum nos banhos públicos, também
considerados uma espécie de terapia.
Uma
das medidas preconizadas para tratamento de epilepsia era a aplicação de
sanguessugas na região do baço com objetivo de desviar o material
mórbido da cabeça para este órgão, sobre o qual eram aplicados fezes de
pombos e ovos de corvos, promovendo febre, a qual, como a
malarioterapia, poderia curar epilepsia.
Cauterização
era também preconizada, devendo ser realizada no occiput ou no bregma,
sendo recomendado que o cautério queimasse desde o crânio até as
meninges. As mães cauterizavam suas próprias crianças visando a remoção
da fleuma e dos humores demoníacos do cérebro.
A
conversão do Imperador Constantino e a ascensão do Cristianismo no
século 4 d.C. introduziram o conceito de que Deus provê e que nada cabia
ao homem diante da providência divina. As curas passaram a incluir
orações, jejum, rogar auxílio aos santos e, freqüentemente,
peregrinações às suas sepulturas.
Os santos
Entre
os santos associados à doença estão São João, São Vito, São Valentim e
Santa Bibiana. São João provavelmente se refere a São João Batista, cujo
nome é ligado à erva de São João (Hypericum perforatum), planta cujas
manchas avermelhadas na parte inferior de suas folhas contendo glândulas
com óleo, simbolizam seu sangue ao ser decapitado por Herodes sob a
cruel insistência da filha Salomé. A erva, quando infundida em óleo e
exposta à luz solar, gradualmente tinge o líquido de cor vermelha
rutilante, o sangue de São João. Ainda hoje muito utilizada no
tratamento dos transtornos afetivos e do humor, afasta os demônios e
substâncias tóxicas da mente, corpo e espírito, promovendo calma,
entusiasmo e vitalidade.
Uma das teorias
sobre a ligação de São João Batista à epilepsia, se refere ao fato de
que sua cabeça caiu ao ser decapitado. Na França, uma designação popular
da doença era mal de São João.
O
nome de São Valentim, o santo mais fortemente ligado à epilepsia,
possivelmente se refere a dois mártires legendários cujas vidas tiveram
bases históricas. O primeiro foi um pregador e médico romano martirizado
durante a perseguição dos cristãos e enterrado na Via Flamina onde o
Papa Júlio I erigiu uma basílica e o outro foi bispo de Terni na Itália.
Eventualmente, trata-se de versões diferentes sobre a mesma pessoa. A
associação de São Valentim à epilepsia provavelmente se originou na
Alemanha e etimologicamente decorre do fato que nos dialetos do sul
daquele país (também falados na Áustria, Suíça e partes da França e
Itália na fronteira com a Alemanha e Áustria) a primeira letra deste
nome é pronunciada com “f”. Na resultante “Fallentin”, a inversão do
“en” origina “Fall net (h)in” palavra que nestes dialetos significa “não
caia!” (o sufixo “net” equivale ao “nicht” no alemão do norte).
Valentim teria sido julgado e condenado em 260 d.C. sob Cláudio, o Godo,
em 14 de fevereiro (dia de São Valentim). Locais de peregrinação ao
mártir incluíram Roma e Terni na Itália, Ruffach na França, Poppel na
Bélgica e Passau na Alemanha.
Patrono dos
namorados, pois secretamente realizava a união de casais cristãos
desafiando a lei do Imperador Cláudio que impedia seu matrimônio, ele é
evocado contra epilepsia, cólera e desmaios tendo se tornado tão popular
para os epilépticos que, no final do século 15, foi construído um
hospital para estes pacientes no convento de São Valentim em Ruffach, na
Alsácia. A peregrinação a Ruffach terminou com a revolução francesa,
pois Ruffach fica próxima a Strasbourg, uma das cidades mais importantes
na revolução. Seus edifícios foram destruídos na segunda metade do
século 19 e do local de peregrinação restam apenas alguns resquícios. Na
paróquia da igreja da Virgem em Ruffach há um relicário com uma pequena
parte do crânio de São Valentim.
A conduta em uma crise epiléptica.
O Renascimento
A
conquista de Constantinopla pelos turcos em 1453 d.C., é tida como
sendo o marco histórico que indica o fim da Idade Média e o início da
Renascença. A mais notável faceta do Renascimento foi o movimento
humanista, iniciado no norte da Itália, que reviveu o espírito da
Antigüidade clássica através do estudo reverente dos autores gregos e
latinos, possível pela chegada à Itália dos estudiosos foragidos de
Constantinopla. Ainda nesta época prevaleciam no ensino médico as
doutrinas Hipocráticas e Galênicas, embora a anatomia e a fisiologia
humanas tenham sido enriquecidas pelas dissecações do corpo humano e
pela contribuição de importantes pintores e escultores. Entre as
primeiras, a de Andreas Vesálio (1515-1564), de Bruxelas, cirurgião e
médico, professor da Universidade de Pádua, que em 1.543, aos 28 anos de
idade, publicou sua obra prima, De Humani Corporis Fabrica Libri
Septem, conhecida universalmente como Fabrica, tratado constituído por
sete livros baseado em Galeno cujo conteúdo ricamente ilustrado,
permitiu a expressão visual perfeita de conceitos anatômicos.
O
sétimo livro desta obra era inteiramente dedicado ao cérebro e aos
órgãos dos sentidos. Nele Vesálio corrigiu cerca de 200 erros galênicos,
entre eles o da existência de orifícios entre os ventrículos cardíacos.
Para a mais magnífica obra de xilografia jamais produzida, contribuíram
discípulos de Ticiano (e possivelmente o próprio pintor) e o impressor
Johannes Oporinus, da Basiléia, para onde as obras eram enviadas sobre
mulas através dos Alpes. Entre as contribuições de artistas, detaca-se a
de Leonardo da Vinci (1452-1519) que, baseado em suas dissecações em
animais e em cadáveres humanos produziu uma grande série de desenhos e
esboços anatômicos de todo corpo humano.
O século 16. Paracelso (1493-1541)
No
século 16, Paracelso, um importante médico suíço que adotou este nome
em substituição a Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von
Hohenheim por acreditar-se superior a Celso, usou conceitos conflitantes
sem disciplina científica. Atirou na fogueira as obras de Avicena e
Galeno por considerá-las obsoletas e terem desvirtuado os princípios
hipocráticos, dos quais era ardoroso defensor. Seus livros eram ricos em
informações, advindas de fontes variadas que incluíam desde vagabundos,
açougueiros e barbeiros a professores, pois Paracelso foi convidado a
lecionar na universidade da Basiléia. Como alquimista, tratava epilepsia
com uma mistura de religiosidade, alquimia, mágica (partes do crânio e
do sangue da cabeça de um homem decapitado) e astrologia (removendo o
paciente da influência das estrelas). Entretanto, acelerou o uso de
substâncias químicas no tratamento como ópio, ferro, cobre, mercúrio e
enxofre popularizando a utilização de tinturas e extratos alcoólicos.
Neste período e durante todo o século 16, a Igreja Católica desencorajou
explicações sobrenaturais para a doença, mas não as curas religiosas,
que também eram encorajadas por Paracelso . Em seu livro “As Doenças que
Privam o Homem de sua Razão”, Paracelso afirmou:
A
doença [epilepsia] ocorre não apenas no homem mas em todas as criaturas
vivas, que também caem em paroxismos semelhantes aos que acometem o
homem. Algumas espécies de animais sofrem a doença de forma hereditária e
por este motivo são por ela impregnados, de tal modo que nenhum de sua
espécie deixa de apresentá-la como pode ser verificado no esquilo e no
leão, os quais tornam-se doentes sem causa aparente.... Os terremotos e a
doença das quedas têm as mesmas causas... pois o movimento da Terra é
também o movimento do homem e todos os que vivem na Terra o
experimentam.
Paracelso (1567), citado por Lennox na abertura do primeiro volume de sua obra de 1.960
O século 18. O Iluminismo
A
Europa do século 18 foi o berço de uma revolução intelectual que varreu
os remanescentes da anarquia feudal e do dogmatismo medieval. Os homens
passaram a crer que, aplicando as imutáveis leis da natureza à
política, à filosofia, à ética, à religião e à economia, poderiam
construir a sociedade perfeita.
http://www.epilepsiabrasil.org.br/